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Mêncio (03) - por Alfredo Doeblin

1o Seção.

1. Pang Kang disse “O objetivo do carpinteiro e do cons­trutor de carruagens é ganhar a vida com seu trabalho. Será também propósito do homem superior ganhar a vida com a prática de seus princípios?” “Que tens a ver com seu propósito?”, perguntou Mêncio. “Ele é útil a ti. Merece ser apoiado e será apoiado. Deixe que pergunte: Remuneras a intenção de um homem ou remuneras seu serviço?” Ao que Kang replicou: “Remunero sua intenção”.

2. Disse Mêncio: “Há aqui um homem que quebra o teu telhado e desenha figuras repugnantes em tuas paredes. Seu propósito pode ser o de ganhar a vida com isso; mas tu irás remunerá-lo?” “Não”, disse Kang. Mêncio então concluiu: “Nesse caso não é a intenção que remuneras, e sim a obra realizada”.

3. Disse Mêncio: “Ao estudar extensamente e ao discutir minuciosamente o que estuda, o objeto do homem superior é capacitar-se para resumir e explicar com brevidade o essencial”.

4. Disse Mêncio: “Aquele que quer dominar os homens com sua excelência nunca foi capaz de dominá-los. Deixai que um príncipe trate de educar os homens com sua excelência e será capaz de dominar todo o reino. É impossível que possa chegar a governar um povo aquele a quem o povo não outorgou a submissão de seu coração”.

5. Disse Mêncio: “Aquilo pelo qual o homem superior se distingue dos demais é o que guarda no coração: benevolência e correção”.

“O homem benévolo ama os demais. O homem correto respeita os demais”.

“Aquele que ama os demais é constantemente amado por eles. Aquele que respeita os demais é constantemente respei­tado por eles”.

Há um homem que me trata de modo perverso e nada razoável. Neste caso, o homem superior dirá a si mesmo: “Deve haver-me faltado benevolência. Deve haver-me faltada correção. Como pode ter acontecido isso?”

6. “Examina-se a si mesmo e é acentuadamente benévolo. Esquadrinha o seu íntimo, e é especialmente respeitoso à correção. A perversidade e a má conduta do outro, no entanto, continuam a existir. O homem superior voltará a dizer-se: “Não terei feito tudo o que podia?”

7. “Volta sobre si mesmo e continua a fazer tudo o que pode, mas apesar disso repetem-se a perversidade e a má conduta do outro. À vista disso, o homem superior diz: “Evidentemente, este é um homem completamente perdido! Pois que se conduz desse modo, que diferença existe entre ele e um animal? Por que hei de contender com um animal?”

8. Disse Mêncio: “O homem superior tem três coisas com as quais se apraz e ser governante do reino não é uma delas”.

“Que seu pai e sua mãe estejam vivos e a situação de seus irmãos não seja motivo de inquietação; este é o primeiro prazer”.

“Que ao olhar para cima tenha motivo de se envergonhar diante do Céu, e quando olha para baixo não tenha motivo para ruborizar-se diante dos homens: este é o segundo prazer.

“Que possa obter em todo o reino os indivíduos de mais talento e ensiná-los e educá-los: este é o terceiro prazer”.

9. “O homem superior tem três coisas com as quais se deleita e ser governante do reino não é uma delas”.

Disse Mêncio: “O homem superior deseja amplo território e numerosos cidadãos, mas não é isso que lhe dá prazer”.

“Manter-se à frente do reino e tranqüilizar o povo dentro dos quatro mares. O homem superior deleita-se com isso, mas não é esse o mais alto prazer de sua nobreza”.

“O que por sua natureza corresponde ao homem superior não pode aumentar pela amplitude de sua esfera de ação nem diminuir pelo fato de viver ele em pobreza e em retiro, pois que isso é proporcionado determinadamente pelo Céu”.

“O que corresponde por sua natureza ao homem superior é a benevolência, a retidão, a correção e o conhecimento. Estas coisas estão arraigadas em seu coração. Seu desenvolvimento e manifestação são uma humilde harmonia no semblante, uma rica plenitude no peito e o caráter manifestado em seus quatro membros. Esses membros sabem agir por si mesmos, sem serem ensinados”.

10. Disse Mêncio: “Quando os bons princípios prevalecem em todo o reino, os princípios do cada um devem aparecer juntos com a pessoa de cada um. Quando os bons princípios desaparecem do reino, a pessoa de cada um deve desaparecer com os princípios de cada um”.

“Não ouvi que os princípios de cada um dependem de sua manifestação em outros homens”.



2o Seção.

1. Disse Mêncio: “A benevolência é a inteligência do homem e a retidão é o seu caminho”.

“Que lamentável é descuidar o caminho e não segui-lo, perder sua inteligência e não saber buscá-la de novo!”

“Quando os homens perdem suas aves e seus cães sabem procurá-los de novo, mas perdem a inteligência e não sabem como encontrá-la”.

“O grande fim da ciência não é outro senão o de procurar a inteligência perdida”.

2. Mêncio disse: “Todos os homens possuem uma inteli­gência que não pode suportar a visão dos sofrimentos dos demais”.

“Os antigos reis possuíam inteligência compassiva e, como natural conseqüência, exerciam igualmente um governo com­passivo. Quando com inteligência compassiva se exercia um governo compassivo, governar o reino era coisa tão fácil como fazer girar alguma coisa na palma da mão”.

“Quando digo que todos os homens possuem uma inteli­gência que não pode suportar a visão dos sofrimentos alheios, o significado de minhas palavras pode ser assim esclarecido: hoje em dia inclusive, se os homens vêem de repente uma criança que está quase caindo num poço, todos eles, sem exceção, experimentam uma sensação de alarma e angústia. Sentirão assim, não porque por isso possam obter o favor dos pais da criança, nem porque possam conseguir o elogio dos vizinhos e amigos, nem porque seja desagradável a fama de terem ficado insensíveis ante esse espetáculo”.

“Por este exemplo podemos verificar que o sentimento de comiseração é essencial no homem, o sentimento de vergonha e tristeza é essencial no homem, o sentimento de modéstia e complacência é essencial ao homem e o sentimento de apro­vação e desaprovação é essencial ao homem”.

3. “O sentimento de comiseração é o princípio da benevo­lência. O sentimento de vergonha e desgosto é o princípio da retidão. O sentimento de modéstia e complacência é o prin­cípio da correção. O sentimento da aprovação e desaprovação é o princípio do conhecimento”.

4. “Os homens possuem estes quatro princípios do mesmo modo que possuem seus quatro membros. Quando os homens, tendo estes quatro princípios, dizem de si mesmos que não podem desenvolve-los, enganam-se a si mesmos. E aquele que diz de seu príncipe que não pode desenvolve-los, engana o príncipe”.

“Pois que todos homens possuem em si mesmos esses quatro princípios, fazei com que saibam dar-lhes todo o seu desenvolvimento e terminação, e a conseqüência será como a do fogo que começou a arder ou a da fonte que começou a jorrar. Deixai que se desenvolvam completamente e bastarão para amar e proteger tudo o que está dentro dos quatro mares. Nega-lhes esse desenvolvimento, e não bastarão para que um homem sirva com eles a seus pais”.

5. Disse Mêncio: “Aquele que faz as flechas é menos benévolo do que o que faz a armadura defensiva? No entanto, o que faz as flechas só teme que os homens não sejam feridos e o homem que faz a armadura só teme que os homens sejam feridos. O mesmo acontece ao sacerdote e ao construtor de esquifes. A escolha de uma profissão, por isso mesmo, é coisa que requer grande prudência”.

6. Disse o filósofo Gao: “A natureza do homem é como o arbusto Chi, a retidão é como uma chávena. Formar a benevolência e a retidão com a natureza do homem é como fazer chávena com o arbusto Chi.”

Replicou Mêncio. "Poderás, sem tocar a natureza do arbusto, fazer chávenas com ele? Deves violentar e danificar o arbusto antes de chegares a fazer chávenas com ele. Se deves violentar e danificar o arbusto para fazer chávenas com ele, de acordo com teus princípios, assim também deves vio­lentar e danificar a humanidade para formar com ela a benevolência e a retidão. Tuas palavras, ah! Certamente levarão todos os homens a reconhecer que a benevolência e a retidão são calamidades!”

7. O filósofo Gao disse: “A natureza do homem é como a água que redemoinha a um canto. Abri-lhe uma passagem para o leste e ela correrá para leste. Abri-lhe uma passagem para o oeste e ela correrá para oeste. A natureza do homem é indiferente ao bem e ao mal, como a água é indiferente ao leste e ao oeste”.

Replicou Mêncio: “Evidentemente a água pode correr indiferentemente para leste ou oeste, mas poderá indiferente­mente correr para cima ou para baixo? A tendência da na­tureza humana para o bem é como a tendência da água para escorrer. Todos os homens têm essa tendência para o bem como todas as águas tendem a correr”.

“Pois bem, batendo a água e fazendo-a saltar podes con­seguir que se levante sobre a tua cabeça. Represando-a, conduzindo-a, podes levá-la ao alto de uma colina. Mas estarão esses movimentos de acordo com a natureza da água? É a força aplicada que os produz. Quando os homens estão feitos para saber o que é bom, sua natureza é tratada desse modo”.

8. “Pois bem, tu dizes: “A natureza é boa”. Então, tudo isso é falso?”

Disse Mêncio: “Em virtude de sentimentos apropriados para isso, está constituída para a prática do bem. Eis o que quero dizer quando digo que a natureza é boa”.

“Se os homens fazem o que não é bom, não se pode culpar suas faculdades naturais”.

“O sentimento de comiseração pertence a todos os homens. O mesmo acontece ao de vergonha e aborrecimento e ao de reverência e respeito e ao de aprovação e desaprovação. O sentimento de comiseração implica o princípio da benevolência. O de vergonha e aversão, o princípio de retidão. O de reverência e respeito, o princípio de correção. O de aprovação e desaprovação, a retidão, a correção e o conhecimento que nos inculcam de fora. Estamos providos desses sentimentos, é claro. E a opinião diferente nasce apenas da falta de reflexão. Daí o se ter dito: “Procurai e encontrareis. Descuidai e perdereis”. Os homens diferem entre si, acerca de si mesmos. Alguns duas vezes mais do que outros, outros cinco vezes e alguns um número de vezes incalculável. Assim acontece porque não podem desenvolver completamente suas faculdades naturais.

9. Disse Mêncio: “Nos anos bons a maioria das criaturas é boa, enquanto nos anos maus a maioria dos homens se entrega ao mal. O se mostrarem tão diferentes não decorre de nenhuma diferença nas faculdades naturais que o Céu lhes outorgou. O abandono é devido às circunstâncias em meio das quais permitem que sua inteligência caia na armadilha que lhes estende o mal, e nela se deixam cair”.

10. “Por isso digo: “As bocas dos homens coincidem nos mesmos gostos. Seus ouvidos coincidem em desfrutar os mesmos sons. Seus olhos coincidem em reconhecer a mesma beleza. Só suas inteligências não coincidem em aprovar a mesma coisa? Que é, então, o que igualmente aprovam? Eu digo que são os princípios de nossa natureza e as decisões da retidão. Só os sábios compreenderam antes de mim aquilo que minha inteligência aprova juntamente com os demais homens. Portanto, os princípios de nossa natureza e as decisões de retidão são agradáveis à minha inteligência do mesmo modo que a carne dos animais que se alimentam de erva e cereal é agradável à minha boca”.



3o Seção.

1. Disse Mêncio: “As árvores da montanha Niû eram for­mosas, outrora. Mas como estavam situadas na fronteira de um grande Estado, foram abatidas a machado. Como podiam conservar sua beleza? No entanto, graças à atividade da vida vegetal, de dia e de noite, e à influência nutritiva da chuva e do orvalho, seus brotos floresceram. Mas chegaram os bois e as cabras e comeram os brotos. A essas causas se deve a desnuda e desoladora aparência da montanha. E quando agora vamos vê-la julgamos que nunca esteve povoada de bosques. Será esta de agora, a natureza da montanha?”.

2. “Assim sucede ao que propriamente corresponde ao homem. Pode-se dizer que a inteligência de qualquer homem careça de benevolência e retidão? O modo pelo qual um homem perde sua bondade de inteligência é como o modo pelo qual perdem as árvores seus ramos à força de machado. Dia e noite ferida, poderá a inteligência conservar sua beleza? Mas se a vida dia e noite se desenvolve numa atmosfera tranqüila, matutina, justamente entre a noite e o dia, a inteli­gência sente de certo modo esses desejos e aversões que são próprios da humanidade, mas esse sentimento não é forte e é encadeado e destruído pelo que aconteceu durante o dia. Esse encadeamento se produz uma vez ou outra, e a influência restauradora não é suficiente para conservar a bondade própria da inteligência. E quando se mostra insuficiente para esse fim, a natureza não se torna muito diferente da dos animais irracionais. Quando então se vê, julga-se que nunca teve essa faculdade que eu afirmo que possui. Acaso representará, essa condição, os sentimentos próprios da humanidade?

3. “Portanto, se recebe seu alimento adequado, não há motivo para que não se possa desenvolver. Se perde seu alimento adequado, não há motivo para que não decaia.

5. Disse Mêncio: “Gosto de peixe e também gosto de patas do urso. Se não posso comer as duas coisas ao mesmo tempo deixarei o peixe e tomarei as patas de urso. Do mesmo modo, amo a vida e amo também a retidão. Se não posso ter ao mesmo tempo as duas, deixarei a vida e ficarei com a retidão”.

6. “Amo verdadeiramente a vida, mas há algo que mais amo do que a vida, portanto não tratarei de possuí-la por meios impróprios. Verdadeiramente abomino a morte, mas há algo que mais abomino do que a morte, portanto há ocasiões em que não fugirei ao perigo”.

7. “Se entre as coisas de que o homem gosta não houvesse nada que lhe agradasse mais do que a vida, por que não havia de utilizar todos os meios para conservá-la? Se entre as coisas de que homem não gosta não houvesse nada que menos lhe agradasse do que a morte, por que não faria tudo para evitar o perigo?”.

8. “Há casos em que os homens, mediante certa conduta, podem conservar a vida, e no entanto não a utilizam. Há casos em que mediante certas coisas podem evitar o perigo, e no entanto não as praticam.

“Portanto, os homens têm aquilo que mais amam do que a vida, e aquilo que mais aborrecem do que a morte. Não são os homens de grande talento e virtude os únicos que possuem essa natureza. Todos a possuem. O que acontece aos pri­meiros é simplesmente isto: não a perdem”.

9. Disse Mêncio: “As palavras bondosas não penetram tão profundamente nos homens como uma reputação de bondade”.

“O bom governo não lança no povo tão profundas raízes quanto as boas recomendações”.

“O bom governo é temido pelo povo, enquanto as boas recomendações são amadas por ele. O bom governo se apodera da riqueza do povo, enquanto as boas instruções se apossam do seu coração”.

10. Disse Mêncio: “Aqueles que aconselham os grandes devem desprezá-los e não se deixarem deslumbrar por sua pompa e exibição. Salões que tem uma altura desmedida, com vigas que res­saltam, se se realizassem meus desejos, eu não teria salões assim. Alimentos servidos à minha frente em salas descomunais e servidores e concubinas às centenas, se meus desejos se realizassem, eu não teria essas coisas. Prazer e vinho e excursões venatórias, com milhares de carruagens que me seguissem se meus desejos se realizassem, eu não os teria. Nada teria eu a fazer com aquilo que os outros apreciam. O que eu aprecio é a lei dos antigos. Por que hei de temê-las?



4o Seção.

1. Mêncio foi visitar o rei Hûi de Liang.

Disse o rei: “Venerável senhor: pois que não te pareceu longe este palácio, à distância de uma centena de li, posso presumir que vens provido de conselhos que beneficiem meu reino?”

Replicou Mêncio: “Que necessidade tem Sua Majestade de usar a palavra “benefício”? O que eu trago são conselhos de benevolência e retidão e esses são os meus únicos temas.

Se Sua Majestade diz: “Que há a fazer para beneficiar o meu reino?”, dirão os altos funcionários: “Que há a fazer para beneficiar nossas famílias? E os funcionários subalternos e o vulgo dirão: “Que há a fazer para beneficiar nossas pessoas?” Superiores e inferiores tratarão de arrebatar-se o proveito uns aos outros e o reino correrá perigo. No reino de dez mil carruagens, o assassino de seu soberano será o chefe de uma família que possua mil carruagens. No reino de mil carruagens o assassino de seu príncipe será o chefe de uma família que possua uma centena de carruagens. Possuir um milhar contra dez ml e uma centena contra mil, não se pode dizer que seja grande parcela; mas se a retidão é postergada e prevalece o ganho, não se satisfarão enquanto não se apoderarem de tudo.

“Nunca houve homem benévolo que abandonasse seus pais. Nunca houve homem reto que tributasse pouco respeito ao soberano”.

“Que a benevolência e a retidão sejam também os únicos temas de Sua Majestade. Por que há de empregar a palavra proveito”?

2. O rei Hûi de Liang disse: “Pequena como é minha virtude, no governo de meu reino de certo exerço o máximo da minha inteligência. Se o ano é mau na parte interior do rio, levo todos os cidadãos que posso ao leste do rio e mando cereal a outra parte. Quando o ano é mau a leste do rio, ponho em prática o mesmo plano. Ao examinar o governo dos reinos vizinhos não creio que haja neles príncipe algum que utilize, como eu, a sua inteligência. E no entanto o povo do reino vizinho não diminui, nem o meu povo aumenta. Como é?”
3. Mêncio respondeu: “Sua Majestade ama a guerra. Permita que tome um exemplo da guerra. Os soldados marcham adiante ao som dos tambores e depois de cruzar as armas com o inimigo, atiram fora suas cotas de malha, arrastam as armas pelo chão e fogem. Uns fogem algumas centenas de passos e se detém. Outros correm cinqüenta passos e estacam. Que pensaria se os que correm cinqüenta passos se rissem dos que correm cem passos?” Disse o rei: “Não devem fazer isso. Ainda que fujam cinqüenta passos apenas, também fogem”.

“Se Sua Majestade sabe disso – replicou Mêncio – não tem porque esperar que seu povo se torne mais numeroso do que o dos reinos vizinhos”.

“Se o tempo indicado para lavrar a terra não é perturbado, haverá mais cereal do que se pode consumir. Se não permite introduzir redes nos remansos e lagoas, haverá mais peixes e tartarugas do que se pode consumir. Se se utilizam os machados nas colinas e nos bosques unicamente no tempo apropriado, haverá mais madeira do que se pode utilizar. Quando o cereal e os peixes e as tartarugas são mais do que se pode comer, habilita-se o povo a alimentar sua vida e chorar seus mortos, sem nenhum ressentimento contra ninguém. Essa si­tuação na qual o povo alimenta sua vida e enterra seus mortos sem nenhum ressentimento contra ninguém é o primeiro passo do governo real”. “Plantai amoreiras em torno das casas com seus cinco mâu e as pessoas de cinqüenta anos poderão vestir-se de seda. Se tiverdes aves domésticas, porcos e cães, não descuideis das épocas de cria e as pessoas de setenta anos poderão comer carne. Não deixeis passar o tempo adequado ao cultivo da granja com seus cem mâu e a família de várias bocas que dela se alimenta não sofrerá fome. Atentai bem na educação das escolas, especialmente inculcando nelas os deveres filiais e fraternos e os homens de cabelos brancos não serão vistos a levar pelas estradas cargas na cabeça ou nas costas. Nunca se viu um governante do Estado onde semelhantes resultados surgem — gente de setenta anos vestindo seda e comendo carne, gente de cabelos brancos que não sofre de fome nem de frio – deixar de alcançar a dignidade real”. “Seus cães e porcos comem os alimentos dos homens e não toma medidas restritivas. Há gente que morre de fome pelos caminhos e não lhes entrega o que têm depositado nos seus celeiros. Quando morre o povo, diz: “Eu não tenho culpa. A culpa é do ano, que é mau”. Qual é a diferença entre apunhalar um homem e matá-lo dizendo: “não fui eu, foi a arma? Deixe Sua Majestade de culpar o ano e instantaneamente virão a si os homens de todas as Nações”.
4. Disse o rei Hûi, de Liang: “Desejo receber tuas instruções”.

Mêncio disse: “Há alguma diferença entre matar um homem com um cajado ou uma espada?” “Não há diferença”, disse o rei. “Há alguma diferença entre matar com uma espada ou com o estilo de governo?” “Não há diferença”, foi a resposta.

5. Então disse Mêncio: “Na tua cozinha há carne gorda e cavalos gordos na sua cavalariça. Mas o teu povo parece faminto e nos lugares despovoadas há quem tenha morrido de fome. Isso leva as feras a devorar os homens”.

“As feras devoram-se umas às outras, e os homens as odeiam por isso. Quando um príncipe, que é o pai do seu povo, administra seu governo de tal modo que se pode culpá-lo de as feras devorarem os homens, onde está sua relação de parentesco com o povo?”
6. Disse o rei: “Que virtude se deve possuir para alcançar o poder real?” Respondeu Mêncio: “O amor e a proteção do povo. Com isso não há força capaz de impedir que um governante alcance o poder real”.

Perguntou novamente o rei: “Um homem como eu é competente para amar e proteger o povo?” Mêncio disse: “Sim”. Como sabes que eu sou competente para isso?” “Ouvi Hû contar o seguinte incidente: “O rei — disse ele — estava sentado no alto do salão quando apareceu um homem conduzindo um boi. O rei o viu e perguntou: “Onde levas esse boi?” Respondeu o homem: “Vamos consagrar um sino com sangue do boi”. Disse o rei: “Deixa-o ir. Não posso suportar sua aparência assustada, como se fosse uma pessoa inocen­te a caminho da execução”. O homem retrucou: “Suprimiremos, então, a consagração do sino?” Disse o rei: “Como pode ser suprimido isso? Troca-o por uma ovelha”. “Não sei se esse incidente ocorreu realmente”.

O rei respondeu: “Realmente” – e então Mêncio disse: “O coração que mostraste nessa ação é suficiente para dar-te o poder real. Todos supunham que tua Majestade cobiçava o animal, mas teus servidores sabem com certeza que o fato de tua Majestade não ser capaz de suportar o aspecto do boi foi o que te fez agir como agiste”.

O rei disse: “Tens razão. E, no entanto, o ato tinha a aparência de ser um daqueles que o povo condena. Mas ainda que Chu fosse um Estado pequeno e pobre, como poderia eu cobiçar um boi? Evidentemente foi porque não podia suportar seu aspecto assustado, como se fosse uma pessoa inocente a caminho da execução e por isso troquei-o por uma ovelha”.

7. Mêncio prosseguiu: “Não pareça estranho a tua Majestade que o povo pensasse que cobiçavas o animal. Quando tro­caste um animal grande por outro pequeno, como podiam saber a verdadeira razão? Se te sentias angustiado porque o levavam para a morte sem ter culpa, que diferença poderia haver entre um boi e uma ovelha?” O rei sorriu e disse: “Qual era realmente minha intenção, nesse caso? Não cobiçava o boi e troquei-o por uma ovelha. Tinha razão o povo para dizer que eu o cobiçava”.

“Não há mal em que digas isso — afirmou Mêncio. Tua conduta era um artifício de benevolência. Viste o boi e não viste a ovelha. O homem superior sente tanta afeição pelos animais que tendo-os visto vivos não pode suportar o vê-los mortos. Tendo ouvido seus gritos, não pode comer sua carne. Por isso mantêm-se afastado do matadouro e da cozinha”.

8. O rei mostrou-se satisfeito e disse: “No Livro de Poesia está escrito: “Mediante a reflexão sou capaz de julgar as intenções dos outros”. Isso prova, Mestre, ao descobrires os motivos do meu ato. Eu fiz aquilo, mas quando voltei meus pensamentos para mim mesmo e examinei o meu íntimo, não pude descobrir minha própria intenção. Quando tu, Mestre, disseste essas palavras, os movimentos de compaixão começaram a trabalhar na minha mente. Como é que este coração tem em si aquilo que iguala o poder real?”

Mêncio replicou: “Supõe que um homem fizesse a tua Majestade esta declaração: “Minha força é suficiente para levantar três mil “kâti” mas não basta para levantar uma pena. Minha vista é bastante aguda para examinar a ponta de um cabelo, mas não vejo um carro carregado de lenha”. Admitiria tua Majestade estas palavras?” “Não”, foi a resposta, depois da qual, Mêncio prosseguiu: “Pois bem, há bondade suficiente para beneficiar os animais, mas o povo não se beneficia com ela. Como é isto? Ter-se-á de fazer aí uma exceção? A verdade é que a pena não é levantada porque não se emprega a força. O carro carregado de lenha não é visto porque não se emprega a vista. E o povo não é amado nem protegido porque não se emprega a bondade. Portanto, o fato de tua Majestade não exercitar o poder real se deve a que não o exercitas e não a que não sejas capaz de fazê-lo”.
9. O rei perguntou: Como pode ser representado a diferença entre não fazer uma coisa e não ser capaz de fazê-la?” Mêncio respondeu: “Se se trata de algo como por sob o braço a montanha Tai e com ela pular o mar do Norte, e dizes ao povo: “Não sou capaz de fazê-lo”, trata-se de um verdadeiro caso de incapacidade. Se se trata de arrancar os galhos de uma árvore por ordem de um superior e dizer: “Não sou capaz de fazê-lo, trata-se de um caso de não fazer e não de um caso de não ser capaz de fazê-lo. Portanto, o fato de tua Majestade não exercer o poder real não é um caso como tomar a montanha Tâi sob o braço e saltar com ela sobre o mar do Norte. O fato de tua Majestade não exercer o poder real é um caso como quebrar os galhos de uma árvore”.“Trata com o respeito devido à idade os mais velhos de tua própria família, de modo que os mais velhos das famílias alheias sejam igualmente tratados. Trata com a bondade devida à juventude os jovens de tua própria família, de modo que os jovens das famílias alheias sejam tratados igualmente. Faz isso e o reino andará bem. No Livro de Poesia está escrito: “Seu exemplo influiu na esposa. Chegou até os irmãos e a família do Estado foi por ele governada”. Esta declaração mostra como o rei Wen tomou simplesmente seu coração bondoso fazendo-o agir. Portanto o exercício da bondade de coração por um príncipe bastará para o amor e proteção de todos os que vivem dentro dos quatro mares, e se não o faz agir não será capaz de proteger nem mesmo a esposa e os filhos. O modo pelo qual os antigos chegaram a superar em muito os outros homens não foi outro senão este: simplesmente sabiam muito bem como realizar o que faziam, de modo a que influísse nos demais. Pois bem, tua bondade é suficiente para beneficiar os animais, mas dela não decorrem benefícios para o povo. Como é isto? Terei de fazer nesse ponto uma exceção?

“Pesando-as, sabemos quais são as coisas leves e as pesadas. Medindo-as, sabemos quais as grandes e quais as pequenas. As relações de todas as coisas podem ser determina­das do mesmo modo e é da maior importância julgar os movimentos da mente. Rogo a tua Majestade que os julgue”.

“Reúnes teus equipamentos de guerra, pões em perigo teus soldados e oficiais e excitas o ressentimento dos outros príncipes. Essas coisas causam prazer à tua mente?”

10. Respondeu o rei: “Não. Como podem causar prazer essas coisas? Meu objetivo, ao fazê-las, é conseguir aquilo que tanto desejo”.

Mêncio disse: “Posso ouvir de teus lábios que é isso que tanto desejas?” O rei sorriu e silenciou. Mêncio resumiu: “O que te leva a desejar isso é não teres alimento bastante para tua boca? Nem roupas leves e quentes para teu corpo? Ou não teres suficientes objetos de belas cores para prazer de teus olhos? Ou não teres vozes bastantes nem músicas para deleite de teus ouvidos? Ou não teres suficientes ajudantes e favoritos que diante de ti esperam suas ordens? Os numerosos funcionários de tua Majestade são suficientes para proporcio­nar-te essas coisas. Como pode tua Majestade ser levada a abrigar semelhante desejo a respeito delas”. “Não - disse o rei - meu desejo não se refere a elas”. Acrescentou Mêncio: “Então, o que tua Majestade tanto deseja pode ser conhecido. Desejas aumentar teu território, ter a serviço de tua corte Qin e Chu, governar o Reino do Meio e atrair para ti as tribos bárbaras que o cercam. Mas fazer o que fazes para conseguir o que desejas é como subir a uma árvore à procura de peixes”.

11. Disse o rei: “É tão errado assim?” “Pior ainda”, foi a resposta. “Se sobes a uma árvore para procurar peixes, ainda que não consigas peixes não sofrerás calamidades como conseqüência. Mas fazendo o que fazes para conseguir o que desejas e ainda mais fazendo de todo o coração, decerto encon­trarás mais tarde as calamidades conseqüentes”. O rei pergun­tou: “Podes dar-me prova disso?” Disse Mêncio: “Se o povo de Zhao lutasse contra o povo de Chu, qual deles tua Majestade julga que sairia vencedor?” “O povo de Chu sairia vencedor”. “Sim. É certo que um país pequeno não pode lutar contra muitos, pois o fraco não pode com o forte. O critério dentro dos quatro mares abrange nove divisões, cada uma com um milheiro de li quadrado. Todo Qi junto não é mais do que uma delas. Se com uma parte tratas de submeter as outras oito, qual é a diferença entre isso e a contenda de Zhao e Chu? Pois com semelhante desejo deves voltar ao método apropriado para conseguí-lo.

12. Disse o rei: “Sou um estúpido e não sou capaz de atingi-lo. Desejo que tu, Mestre, ajudes minhas intenções. Ensina-me claramente; ainda que minha inteligência e meu vigor não sejam suficientes, procurarei levar à prática tuas instruções”.

Mêncio replicou: “Só os homens instruídos são capazes, sem certos meios de subsistência, de manter um coração constante. Quanto ao povo, se não tem certos meios de subsistência, não terá um coração constante. E se não tem um coração constante, nada fará senão por meio do abandono, do desvio moral, da depravação e da libertinagem. Quando assim se envolve no crime segui-lo e castigá-lo, é agarrar o povo numa armadilha. Como se pode fazer uma coisa como esta, agarrá-lo numa armadilha, sob o governo de um homem benévolo?

“Portanto, um governante inteligente ordenará a subsis­tência do povo, de modo a assegurar que os que estão por cima tenham o suficiente para servir seus pais e aqueles que estão por baixo tenham o suficiente para manter suas esposas e seus filhos; que nos anos bons todos possam satisfazer abun­dantemente suas necessidades e nos anos maus todos escapem ao perigo da morte. Depois disso, deve estimular o povo para que faça — e ele deve também fazer — o bem, pois nesse caso o povo fará com facilidade”.

Pois bem, a subsistência do povo é regulada de tal modo que os de cima não têm o suficiente para servir a seus pais e os de baixo não têm o suficiente para manter suas esposas e seus filhos. Apesar dos anos bons, suas vidas estão continuamente amargurada, e nos anos maus não escapam à morte. Em semelhantes circunstâncias só tratam de salvar-se a si mes­mos da morte e têm medo de não conseguí-lo. De que ócio dispõem para cultivar a correção e a honradez?
“Se tua Majestade deseja levar a cabo essa “regulamentação da subsistência do povo” por que não adota o que constitui providência inicial para conseguí-la?

“Plantai amoreira em redor das casas com seus cinco mu e as pessoas de cinqüenta anos poderão vestir-se de seda. Se tiverdes aves domésticas, porcos e cães, não descuideis das épocas de cria, e as pessoas de setenta anos poderão comer carne. Não deixeis passar o tempo adequado para o cultivo da granja com seus cem mâu e a família de várias bocas que dela se alimenta não passará fome. Dedicai cuidadosa atenção à educação das escolas, inculcando especialmente os deveres filiais e fraternos e homens de cabelos brancos não mais serão vistos pelos caminhos levando carga na cabeça e nas costas. Nunca se viu que o governante de um Estado no qual não se encontram semelhantes resultados — gente de setenta anos vestindo seda e comendo carne, gente de cabelos brancos que­ não passa fome nem sofre frio – não atinja a dignidade real”.



5o Seção.

1. O povo de Qi atacou Yen e o conquistou.

O rei Xuan perguntou: “Alguns me dizem que não tome posse dele por mim mesmo, e outros dizem que tome posse deles. Para um reino de dez mil carruagens, completar sua conquista em cinqüenta dias é uma façanha que supera a força humana. Se não toma posse dele, cairão sobre mim, de certo, as calamidades do Céu. Que dizes acerca de minha posse sobre ele?”

Respondeu Mêncio: “Se o povo de Yen se alegrasse de que te aposses deles, deves fazê-lo. Entre os antigos havia um que agia de acordo com esse principio, o rei Wu. Se o povo de Yen não se alegra em tomares posse dele, não o faças. Entre os antigos havia um que agia de acordo com esse princípio, o rei Wen”.

“Quando, com toda a força de teu país de dez mil carruagens, atacaste outro país de dez mil carruagens e o povo trouxe cestos de arroz e oferendas de boas-vindas para receber as hostes de tua Majestade, havia outra razão para essa atitude, além do desejo de se livrarem do fogo e da água? Se tornares a água mais profunda e mais cruel o fogo, farão, do mesmo modo, outra revolução”.

2. O povo de Qi tendo vencido o de Yen , apossou-se dele. Ao ter noticia disso, os príncipes dos diversos Estados se reuniram para deliberar e resolveram libertar Yen do seu poder. O rei Xuan disse a Mêncio: “Os príncipes formaram muitos planos para me atacar. Como devo preparar-me para vencê-los? “Mêncio replicou: “Ouvi de algum que com setenta li exerceu todas as funções do governo no reino. Era Tang. Nunca ouvi de um príncipe que com um milhar de li sentisse medo dos outros”.
3. No Livro de História está escrito: “Mal começara sua tarefa de fazer justiça, Tang começou com Ho. Todo o reino tinha confiança nele. Quando realizava sua obra no leste, as tribos do oeste murmuravam. O mesmo fizeram as do norte quando ele estava ocupado no sul. Seu clamor era este: “Por que nos deixa para o fim ?” Assim, o povo esperava o que nós esperamos em tempo de seca das nuvens e do arco-íris. Os freqüentadores dos mercados não discutiam. Os agricultores não faziam traçada em suas operações. Enquanto punia a seus governantes, amparava o povo. Seu progresso era como a queda de uma chuva oportuna, e o povo estava encantado. Também se diz no Livro de História: “Esperamos durante muito tempo o nosso príncipe. A chegada do príncipe será a nossa restauração!”

“Pois bem, o governante de Yen tiraniza seu povo e tua Majestade foi e o puniu. O povo supôs que fosses para livrá-lo da água e do fogo e levou cestos de arroz e oferendas de boas-vindas para receber as hostes de tua Majestade. Mas tu mataste seus pais e irmãos mais velhos e, prendestes seus filhos e irmãos mais moços. Demoliste o templo ancestral do Estado e levaste para Qi seus vasos preciosos. Como pode ser considerado justo esse procedimento? O resto do reino teme, na verdade, a força de Qi. E agora, quando tens o dobro do território, não pões em prática um governo benévolo. Isto é o que põem em movimento as armas do reino.

4. “Se tua Majestade se apressasse a ordenar a libertação de seus prisioneiros, velhos e jovens, a interrupção do transporte dos vasos preciosos e, depois de consultar o povo de Yen, designasses para ele um governante e te retirasses do país, ainda serias capaz de deter o ataque que te ameaça”.

5. Houvera uma escaramuça entre Cau e Lu, quando o duque Mu perguntou a Mêncio: “Entre meus funcionários foram mortos trinta e três homens e ninguém do povo quis morrer em defesa deles. Ainda que os tenha condenado à morte por sua conduta é impossível matar a multidão. Se não os mato, fica sem castigo o crime de ter visto a morte de seus funcionários e não tê-los salvado. Que se deve fazer, neste caso?”
Mêncio respondeu: “Nos anos calamitosos e nos anos de fome, teus sábios velhos e fracos, que foram encontrados jazendo nos fossos e canais, e os fortes que se dispersaram pelos quatro cantos, chegaram a vários milhares. Enquanto isso teus celeiros, ó Príncipe, estavam cheios de cereais e teus tesouros e arsenais repletos. E nenhum de teus funcionários te falou em miséria. Assim foram negligentes os superiores do teu Estado e cruéis com os inferiores. O filósofo Cang disse “Cuidado, cuidado, o que vem de ti voltará novamente a ti”. Pois bem, afinal o povo vingou-se do procedimento dos funcionários. Não o culpes, ó Príncipe.

“Se tivesse realizado um governo benévolo, esse povo teria amado a ti e a todos os que estão sobre ele: teria morrido pelos funcionários”.

6. Kung-sun Chao perguntou a Mêncio: “Mestre: se fosses designado para alta nobreza, no cargo de primeiro-ministro de Qi, de modo que pudesses por em prática os teus princípios, não haveria que admirar se elevasses o governante à chefia de todos os outros príncipes e até à dignidade real. Nessa posição, tua mente perturbar-se-ia ou não?” Mêncio respondeu: “Não. Aos quarenta anos de idade, consegui tornar impertur­bável a minha mente”.

Chao disse: “Pois que assim, é, Mestre, superas em muito a Man Pan”. “A mera obtenção — disse Mêncio — não é difícil. O douto Zhou conseguiu mente imperturbável muito mais cedo na vida, do que eu”.

7. Chao perguntou; “Existe algum modo de conseguir tornar a mente imperturbável?” A resposta foi: “sim”.

“Pi kung Yu tinha o seguinte modo de se educar: não se acovardava ante nenhum golpe recebido no corpo. Mantinha fixos os olhos ante qualquer avanço. Considerava que se alguém lhe dava o mais leve empurrão, era como se fosse espancado diante da multidão na praça do mercado, e o que não tivesse suportado de um homem comum com sua ampla veste de pele de porco, também não tinha por que suportar de um príncipe de dez mil carruagens. Considerava apunhalar um príncipe de dez mil carruagens o mesmo que apunhalar um homem vestido de pele de porco. Não temia nenhum dos príncipes. Respondia sempre a qualquer má palavra que lhe dissessem.

8. “Mang Shi She tinha o seguinte modo de se educar: “Considero do mesmo modo o conquistador e o conquistado. Examinar rapidamente o inimigo e logo avançar. Calcular as oportunidades de vitória e logo se atirar à luta. Eis o que é temer a força adversa. Como posso garantir-me o triunfo? A única coisa que posso fazer é tornar-me superior a todo o medo”.

9. O povo de Chia destruiu Yen. Alguém perguntou a Mêncio: “É verdade que aconselhaste Chia a destruir Yen? Ele respondeu: “Não. Shan Tung me perguntou se Yen podia ser destruído, e eu respondi: “Pode”. Em conseqüência, fo­ram e o destruíram... Se me houvesse perguntado: “Quem pode destruí-lo?”, eu teria respondido: “Aquele que é ministro do Céu pode destruí-lo”. Supõe o caso de um assassino sobre o qual alguém me pergunta: “Pode ser morto esse homem?“ Eu responderia: “Pode”. Se me perguntam: Quem pode matá-lo?”, eu responderia: “Pode matá-lo o juiz dos que julgam o crime”. Pois bem, como posso aconselhar que um Yen destrua outro Yen?”

10. O duque de Wen de Tang perguntou a Mêncio acerca do modo adequado de governar um reino.

Disse Mêncio: “Não se pode atender descuidadamente os assuntos do povo. No Livro de Poesia está escrito”:

Durante o dia, vai-te e recolhe o gado,

E, de noite, trança as cordas,

Sobe depressa ao telhado;

Logo devemos começar a nova sementeira.

“O modo de agir do povo é o seguinte: “Se possuem um meio de vida seguro terão um coração constante. Se não possuem um meio de vida seguro, não têm um coração constante. E se não têm um coração constante, nada haverá que não façam ­por meio do abandono de si mesmo, do desvio moral, da depravação e de libertinagem. Uma vez envoltos assim no crime, perseguí-los e castigá-los é agarrar o povo numa armadilha­. Como se pode fazer uma coisas dessas, agarrar o povo numa armadilha, sob o governo de um homem benévolo?”

“Portanto, um governante dotado de talento e virtude será muito complacente e econômico, demonstrará respeitosa cortesia para com seus ministros e tomará do povo apenas dentro de limites previamente regulados”



6o Seção.

1. Chegou de Chu a Tang um tal Xu Xing, que declarou agir de acordo com as palavras de Shan Mang. Foi direito à porta e se dirigiu ao duque de Wen, dizendo: “Homem de longínqua religião, ouvi que tu, Príncipe, realizas um benévolo governo e desejo receber um terreno para edificar uma casa e converter-me em cidadão do teu povo”. O duque Wen deu-lhe uma casa. Seus discípulos, que ascendiam a várias dezenas, vestiam todos roupas de crina, faziam sandálias de cânhamo e teciam esteiras para as casas.

Ao mesmo tempo, Chan Xiang, discípulo de Chan Liang, e seu irmão mais moço, Xin com suas esteiras às costas chegaram de Sung a Tang, dizendo: “Ouvimos que tu, Príncipe, pões em prática o governo dos antigos sábios demonstrando que também és um sábio. Desejamos ser súditos de um sábio”.

2. Quando Chan Xiang viu Xu Xing, este lhe agradou muito e abandonando completamente tudo o que aprendera, fez-se seu discípulo. Numa entrevista com Mêncio, mencionou com aprovação as palavras de Xu Xing, que eram as seguin­tes: “O príncipe de Tang é na verdade um príncipe digno. No entanto, não ouviu ainda as verdadeiras doutrinas da Anti­güidade. Pois bem os príncipes sábios e capazes devem cultivar a terra do mesmo modo que seu povo e juntamente com ele e comer o fruto do seu trabalho. Devem preparar seus próprios alimentos, de manhã e de noite, enquanto ao mesmo tem­po exercem o governo. Pois bem: o príncipe de Tang tem celeiros próprios, tesouros e arsenais e oprime o povo para se alimentar. Como pode ser considerado um príncipe verdadei­ramente digno?”
Disse Mêncio: “Suponho que Xu Xing semeia e come o cereal. Não é assim?” “Assim é”, foi a resposta.. “Suponho também que teça um pano, e vista o pano que teceu. Não é assim?” “Sim, Xu veste roupas de crina”. “Com barrete?’ “Com barrete”. “Que espécie de barrete?” “Um barrete simples”. “Ele mesmo o teceu?” “Não. Obteve-o em troca de cereal”. “Por que não tece o próprio Xu?” “Isso prejudicaria sua produção agrícola”. “Cozinha Xu seus alimentos em panelas e caçarolas de barro e ara a terra com uma ponta de ferro?” “Sim”. “Faz ele mesmo esses utensílios?” “Não. Con­segue-os em troca de cereal”.

3. Então disse Mêncio:

“Conseguir tudo isso em troca de cereal não é menos opressivo para o oleiro e o fundidor, e por sua vez, estes ao trocarem seus diversos utensílios pelo cereal, não são menos opressores do lavrador. Como pode imaginar semelhante co­isa? Por que Xu não trabalha também como oleiro e fundidor, obtendo os artigos que utiliza em seu próprio estabelecimento? Por que negocia e troca atabalhoadamente com os artesãos? Por que não se livra de tanto trabalho?” Chan Xiang respon­deu: “Não se pode de modo algum realizar ao mesmo tempo o negócio do artesão e o do lavrador”. Mêncio concluiu: “Então, só o governo do reino pode ser realizado juntamente com a prática da lavoura? Os grandes homens têm seus negócios próprios e os homens pequenos têm seus negócios próprios. Além disso, no caso de um só indivíduo, quaisquer que sejam os artigos de que possa necessitar, estão ao seu alcance, produzidos pelos diversos artesãos. Se tivesse de fazê-los ele mesmo, todo mundo andaria de um lado para outro, pelos caminhos a fora. Por isso se disse: “Uns trabalham com sua inteligência e outros com sua força. Os que trabalham com sua inteligência governam e os outros, que trabalham com sua força, são governados. Os que são governados ajudam os que governam. Os que governam são ajudados pelos governados”. Este é um princípio universalmente reconhecido”.
4. Outra vez, numa entrevista com o rei, disse Mêncio: “Majestade ouvi o funcionário Zhuang dizer que a música te agrada. É certo?” O rei mudou de cor e disse: “Sou incapaz de amar a música dos antigos soberanos. Só me agrada a música que se acomoda aos costumes do tempo presente”.

Disse Mêncio: “Se o amor de sua Majestade à música fosse muito grande, Qi estaria a ponto de ser um Estado bem governado. A música de hoje em dia é como a música da Antigüidade, nesse ponto”.

Disse o rei: “Podes demonstrá-lo?” Mêncio perguntou: “Que é mais agradável: gozar a música sozinho ou fruí-la com outros?” “Com outros”, foi a resposta. “Que é mais agradável: gozar a música com poucos ou fruí-la com muitos?” – “Com muitos”.

5. Mêncio continuou: “Teu servo deseja explicar o que eu disse sobre a música a tua Majestade”.

“Pois bem: tua Majestade tem música aqui. O povo ouve o som de teus sinos e tambores e as notas de teus pífanos e gaitas, todos, com a cabeça em febre, franzem a testa e dizem uns aos outros: “É assim que nossos reis gostam de música! Por que nos reduzem a este extremo de desgraça? Pais e filhos não se podem ver. Os irmãos mais velhos e os mais moços, as esposas e os filhos estão separados e disseminados por aí”. Pois bem: tua Majestade está aqui caçando. O povo ouve ruído de tuas carruagens e cavalos e vê a beleza de teus penachos e galhardetes, e todos, com a cabeça em febre, franzem as sobrancelhas e dizem uns aos outros: “É assim que os nossos reis gostam de caça! Por que nos reduzem a este extremo de desgraça? Os irmãos mais velhos e os mais moços, esposas e os filhos, estão separados e por aí”. Esse sentimento não se deve a outra razão senão ao povo que desfrute como tu mesmo.

“Pois bem, tua Majestade recreia-se aqui com a música. O povo ouve o som de teus sinos e tambores e as notas de teus pífanos e gaitas, e todos, deliciados, com alegria no olhar dizem uns aos outros: “Isto soa como se o nosso rei estivesse livre de qualquer doença! Se não estivesse como poderia ouvir essa música?” Pois bem, tua Majestade está aqui caçando. O povo ouve o ruído de tuas carruagens e teus cavalos e vê a beleza de teus penachos e galhardetes, e todos, deliciados e com alegria no olhar, dizem uns aos outros: “Isto soa como se nosso rei estivesse livre de qualquer doença! Se não estivesse como poderia divertir-se com esta caça?” Esse sentimento não se deve a outra razão senão ao fato de proporcionares a essa gente os seus prazeres, como tens os teus.

Se tua Majestade fizesse do prazer um bem comum para o povo e para ti mesmo, esperar-te-ia o poder real”.

Instruindo o grande mestre de música de Lû, disse o Mestre: “Pode-se saber como tocar a música. No começo da obra, todas as partes devem soar juntas. A medida que se desenvolve a composição todas as partes devem estar em harmonia, enquanto permanecem individualmente distintas, fluindo sem dissonância e assim até o fim”.

6. Disse Mêncio: “O poder de visão de Li Lao e a habilidade manual de Kung shu, sem o compasso e o esquadro, não podem formar quadrados e círculos. O ouvido percuciente do mestre de música Zhuang, sem o diapasão, não pode determinar corretamente as cinco notas. Os princípios de Yao e Shun, sem um governo benévolo, não podem assegurar a tranqüilida­de do reino.

“Quando os sábios esgotam o vigor de seus olhos chamaram em seu auxilio o compasso, o esquadro, o nível e a régua para tornar as coisas quadradas, redondas, niveladas e retas. O uso de instrumentos é inesgotável. Quando esgota­ram seu poder de ouvir ate o máximo chamaram em seu auxílio o diapasão para determinar as oito notas. O uso do diapasão é inesgotável Quando exerceram até o máximo os pen­samentos de seus corações, chamaram em sua ajuda um governo que não podia suportar a visão do sofrimento dos homens. E sua benevolência espalhou-se por todo o reino”.
7. Disse Mêncio: “O compasso e o esquadro produzem cír­culos e quadrados perfeitos. Por meio dos sábios manifestam-se perfeitamente as relações humanas”.

Disse Mêncio: “O povo tem este ditado: “O reino, o Estado, a família”. A raiz do reino está no Estado. A raiz do Estado na família. A raiz da família na pessoa do seu chefe”.

“Agora desejam não ter opositor em todo o reino, mas não procuram conseguir isso sendo benévolo. É como um homem que pega uma substância quente e antes não a mergulha n’água”.
8. Disse Mêncio: “Como é possível falar com esses príncipes que não são benévolos? Consideram que seus perigos são seguranças, suas calamidades proveitosas e acham prazer nas coisas pelas quais encontram a morte. Se fosse possível conversar com aqueles que assim violam a benevolência, como poderíamos ter semelhante destruição de Estados e ruína de Famílias?”.

9. Disse Mêncio: “Que Xie e Chao perdessem o trono, deve-se a que haviam perdido o povo e perder o povo significa perder seu coração. Há um modo de conservar o reino: conservar o povo. Há um modo de conservar o povo: conservar seu coração. Há um modo de conservar seu coração, que consiste simplesmente em recolher para eles o que desejam e não deixar neles o que não lhes agrada”.

10. O povo volta a um governo regular como a água corre para baixo, como os animais selvagens voltam à solidão da selva.



7o Seção.

1. Mêncio disse: “Com os que violentam a si mesmos é impossível falar. Com os que se desperdiçam a si mesmos, é impossível fazer alguma coisa. Renunciar à correção e à retidão na conversação é o que entendemos por violentar-se a mesmo. Dizer: “Não sou capaz de viver benevolamente ou seguir o caminho da virtude”, é o que entendemos por desperdiçar-se a si mesmo.

2. “A benevolência é a habitação tranqüila do homem e a virtude é seu caminho reto”.

3. “Ai daqueles que deixam vazia a vivenda tranqüila e nela não residem e dos que abandonam o caminho verdadeiro e não o seguem!”

4. Disse Mêncio: “O caminho do dever está no que é próximo e os homens o procuram no que é remoto. A obra do dever está no que é fácil e os homens a procuram no que é difícil. Se cada homem amasse pai e mãe e mostrasse o devido respeito aos seus maiores, o país inteiro gozaria de tranqüilidade”.

5. Kung-sun Chao disse: “Por que o homem superior não ensina por si mesmo ao seu filho?”

Mêncio replicou: “As circunstâncias impedem que ele assim proceda. O mestre deve ensinar o que é correto. Quando ensina o que é correto e suas lições não são praticadas, leva-as adiante com cólera. Quando as leva adiante com cólera, contra o que deverá acontecer, ofende-se com seu filho. Ao mesmo tempo diz o discípulo: “Meu mestre me ensina o que é correto e ele mesmo segue um caminho incorreto”. O resultado disso é que pai e filho se ofendem um com o outro. Quando pai e filho chegam a ofender-se um com o outro, a situação é má.

“Os antigos trocavam seus filhos e um ensinava ao filho do outro”.

“Entre pai e filho não deve haver reprovações e conselhos para o bem. Semelhantes censuras levam à desunião e nada mais é desfavorável do que a desunião”.

6. Disse Mêncio: “O mais rico fruto da benevolência é este: o serviço prestado aos próprios pais. O fruto mais rico da virtude é este: a obediência aos irmãos mais velhos”.

“O fruto mais rico da sabedoria é esse: conhecer essas duas coisas e delas não se afastar. O mais rico fruto da vir­tude é esse: a obediência aos irmãos nessas duas coisas. O fruto mais rico da música é esse: regozijar-se com essas duas coisas. Quando se regozijam com elas crescem. Crescendo, como podem ser reprimidos? Quando chegam a esse estado em que não podem ser reprimidos, os pés começam a dançar e as mãos a mover-se inconscientemente”.
O discípulo Kung tu disse: “Em todo o reino se acusa Zhuang Chang de não cumprir seus deveres para com os pais. Mas tu, Mestre, fazes companhia a ele e até o tratas com cor­tesia. Atrevo-me a perguntar “por que?”

Respondeu Mêncio: “Há cinco coisas que são consideradas pelo uso comum da época como faltar ao dever para com os pais. A primeira é a preguiça no uso dos quatro membros sem atender à alimentação dos pais. A segunda é jogar a dinheiro e abusar do vinho sem atender à alimentação de seus pais. A terceira é apaixonar-se pelos objetos e pelo dinheiro a apegar-se egoisticamente à mulher e aos filhos, sem atender à alimentação dos pais. A quarta é seguir os despojos de seus próprios ouvidos e olhos, até o ponto de provocar a desgraça sobre seus pais. A quinta é gostar de valentia, lutando e disputando a ponto de por seus pais em perigo. Será Chang culpado de algumas dessas coisas?”.

“Pois bem, entre Chang e seu pai há desacordo, pois ele, o filho, reprova o pai para estimulá-lo ao que não é bom”.
“Induzir alguém ao que é bom por meio de censuras é o método dos amigos. Mas semelhante incitamento entre pai e filho é o maior dano para a bondade que deve prevalecer entre eles.”

7. Um homem de Qi tinha uma esposa e uma concubina e vivia com elas em casa. Quando o marido saía, fartava-se de vinho e carne e voltava para casa. E quando a esposa perguntava com quem comia e bebia, estava certa de que todas elas eram pessoas ricas e distintas. A esposa informou à concubina. Quando nosso bom homem sai tem a certeza de que voltará depois de farta libação e comezaina. Perguntei-lhe com quem come e bebe, e todos, segundo parece, são pessoas ricas e distintas. No entanto nunca vem aqui nenhuma pessoa distinta. Quero ver aonde vai o nosso bom homem. Levantou-se cedo e seguiu secretamente o marido por toda parte onde ele foi. Em toda a cidade não houve uma só pessoa que aparecesse falar com ele. Finalmente chegou até os que faziam sacrifícios entre as tumbas fora da muralha de leste, e pediu-lhes o que tinham. Não satisfeito, olhou em torno e foi para outro lugar. Esse era o modo pelo qual se saciava. A esposa voltou para casa e informou a concubina, dizendo: “Este é o nosso esposo, que víamos com esperança e ao qual unimos a nossa sorte toda a vida. Esses são os seus métodos!” Isso dito, junto com a concubina, renegou o marido e, juntas choram na sala. Enquanto isto, o marido sem nada saber, entrou com ar triunfante aproximando-se orgulhosamente da esposa e da concubina. Na opinião de um homem superior, no que se refere aos meios pelos quais os homens buscam riquezas, honrarias, lucro e proveito são poucas as esposas e concubinas que não se envergonhariam e chorariam juntas ao saber dos meios que eles utilizam.
8. Wang Chang perguntou a Mêncio: “Atrevo-me a perguntar quais são os princípios da amizade”. Mêncio respondeu: “A amizade deveria manter-se sem nenhuma presunção oriunda da idade de um, ou de sua posição social, ou das circunstâncias ­de seus parentes. A amizade com um homem é amizade com sua virtude e não admite pressupostas superioridades”.

9. Disse Mêncio: “A habilidade que os homens possuem sem havê-la adquirido pelo estudo é habilidade intuitiva e o conhecimento que possuem sem o exercício do pensamento é seu conhecimento intuitivo”.

‘Todas as crianças de peito sabem amar seus pais e quando crescem um pouco todos sabem amar seus irmãos mais velhos. “O afeto filial pelos pais é obra da benevolência. O respeito pelos mais velhos é obra de retidão. Não há outra razão para esses sentimentos. Pertencem a todos os que vivem sob o Céu”.
10. Disse Mêncio: “Quando Shun vivia no profundo retiro das montanhas, entre árvores e rochedos, vagando entre veados e porcos selvagens, a diferença entre ele e as rudes habi­tantes daquelas alturas remotas, pareciam muito pequenas. Mas quando ouvia uma só palavra boa ou via uma só boa ação, era como um regato ou um rio que saísse da nascente e fluísse numa corrente irresistível”.